Já das nuvens desce o odor que a noite anseia
(não haveria de ter noite mais fria, ou feia)
E o medo que a ronda é tão presente,
Cão de guarda do inferno em chama ardente.
Maldito Hades que me manda seu guerreiro,
Só seu olhar me dilacera por inteiro.
E ainda assim há nessa névoa rala e pouca
Os sussurros de uma voz ecoante e rouca.
“Pássaros negros”, ela diz e eu não respondo.
Sei bem o que quer dizer este seu canto.
Os urubus só aguardam a minha carcaça;
Dos galhos podres observam a sua caça.
Eu morrerei aqui perdido, e disso eu sei.
Queria apenas ter a certeza que gritei.
E os meus pulmões já não suportam os meus urros,
As minhas pernas não agüentam mais os pulos.
Eu definho aqui, onde caí
E pela manhã o Sol para mim não irá abrir...
Não há comida.
Não há água.
Não há porta.
A floresta estéril é figura nua e morta,
É a espectadora-mor do meu desastre.
“Bem, ao menos morrerás com arte”.
Acho delírios e ouço vozes que aqui não estão,
E elas me dizem que comerão vivo o meu coração.
Ainda assim, há névoa rala e tudo é frio.
A noite alta claramente fala para o vazio:
“Aqui acaba a sua mediocridade”.
E eu já creio que é tudo verdade.
Por Deus, há névoa que me arrepia os pêlos!
E eu creio que há sangue em meus cabelos...
Onde estou, e quem está aí de fora?
Será que esta loucura tem memória?
Mas nem a Lua saiu para iluminar-me...
Preferiu virar as costas a ver-me a carne.
E é tão longe a distância até lá em cima...
Meus pensamentos só rondam essa minha sina.
As folhas caem e eu respiro um ar tão pouco...
Daqui do fundo já nem vejo o tronco oco
Da árvore em cuja raiz tropecei...
Maldito passeio noturno que inventei!
Se soubesse não teria levado à cabo o convite taciturno...
Até você,noite-Brutus, assim me trai?
Que por você tantas vezes minha alma se esvai!
Com a escuridão, nem as estrelas presenciarão a minha morte...
Estão todos contingentes com a minha sorte.
Sim, eu morrerei aqui
E este pensamento quase me faz sorrir.
“Há névoa”, a voz sussurra
“E não se foge da névoa que lhe espera”, ela continua.
“E nem do inferno, ou do paraíso que já te conforta. Que seja então a maldita névoa a sua porta!”.
E eu me entrego, pois lutar já não interessa,
O meu corpo foi deixado no ponto ápice da peça,
E a vida resolveu me abandonar.
Quando me encontrarem, diga que foi muito tarde,
Diga que morri sem fazer alarde.
E se perguntarem, foi esta névoa que me dissipou