sábado, 24 de novembro de 2007

O ponteiro mínimo do relógio e suas variáveis.

““ Não me deixe dormir essa noite, faça de mim seu caminho.
O que mais eu poderia dizer?
Não me deixe ficar em seu caminho. ””

Pois tal qual àquela alma atormentada que necessitava de Nelly pra conversar e quebrar sua solidão na saleta. Ele já a via, e sabia que não tardaria muito a sua partida, na verdade fez de um tudo para fazê-la o mais rápido possível, e assim o fez. Hoje repousa ao seu lado naquela terra tranqüila, e passeia pelas colinas, assustando pequenos pastores e seus rebanhos. É o que prefiro pensar.
Por fim, sua alma não era assim de um tanto carrancuda, mas a presença dela a fazia melhor. Viver na escuridão é justificativa pra loucura e violência. Deus meu, o que diabos se passa ou se passou?? Se vim para entender, temo ter falhado, e não ver à minha frente nenhuma solução!
Lutei por tanto tempo sozinho que acabei por me acostumar com a situação. Já não sinto por isso. Ah, como não sinto por isso. Se sinto, meu Deus, explica-me, explica-me sim. Por que me sinto a vontade em meio a musgos e verdolengos ambientes... Tenho tido tanta necessidade... Necessidade essa, que já não me recordo como suprimir, pois faz tanto tempo que venho me feito fortaleza e esquecido minhas preces, que já não sei como me voltar...
Você poderia pegar a estaca e perfurar meu coração antes que o sol nasça? Temo aquilo que posso vir a tornar-me amanhã de manhã... Já não sinto mais o vigor dos braços, ou das pernas. Andam tão fatigados de caminhadas intermináveis, as quais não andei. Se meu sono compensasse, de outra forma... Esqueça, já não sei se quero dormir.
Eles erraram muito em vida, isso é algo inquestionável. Pagaram com a loucura no final. Loucura... Seria esse um mal? Não me entenda por farsante ou aspirante... Queria saber o que pensaram eles minutos, ou mesmo horas antes de encontrar o destino final. Ela foi tão jovem... Teria sido melhor se tivesse permanecido?
Eu me encontro em todos os poemas, todos mesmo... No fim, deixo-me levar pela tolice da poesia. Tolice a qual me permito o luxo de ler - tenho lido muito -. Se os entendo, disso já não sei. Fazem sentido absurdo pra mim. Entendo a poesia, por que sou tão tolo e frívolo quando não controlo a inocência que em mim mora, e a qual não quero deixar partir. É, neguei mesmo o convite, ao final. Paralelamente, tenho visto mais de forma periférica.
Eu me perguntei inúmeras coisas hoje. E das perguntas não tive resposta alguma. Sinto-me fadado a aquiescer o convite oportuno. Não. Falei besteira. Ninguém me mandou convite algum. De forma quase proporcional, têm me feito também muitas perguntas às quais ainda não sei responder...

Por que você tem parecido tão cansado?
Você sente a minha falta?
Gostaria de partir?
Ainda gosta de mim?

E ainda assim eu pareço tão cansado... Dê-me somente um começo de memória e puxarei o fio como num novelo infinito de lã... É que queria muito saber.
No começo, tive um medo absurdo de não saber lidar com sentimentos tão diferentes daqueles aos quais estava acostumado. Não me irrito, e isso me deixa por muito irritado! Na verdade tem muita gente passando, muitas das quais nem conheci, e que se vão e eu me sinto triste. Pois logo, logo horas chegarão.
E então, o que será de mim? Nada tenho feito eu a não ser sustentar-me em meus pilares e sentir-me assim confiante pra viver do lado de fora, aquilo que por dentro se vive muito mais. E se acabar a minha força motriz? E se desgastar meu pilar de mármore? Pergunto então, meu Deus, o que diabos será de mim... Não tenho terras as quais possa vender, não quero mudar-me ou nada construir. Não tenho vícios aos quais possa me apegar... É, eu queria ter um vício para me apegar.
Se sinto? Sinto sim... Mais do que possa parecer. Devo sentir mais do que poderia eu sentir... Por que tenho medo sim, tenho medo de muita coisa... Se tenho me submetido a treinamentos cruéis para aprender a agüentar... Sinto-me forte. E na verdade tão fraco, pois temo menos a própria morte, e mais a de outros que me são caros... Ah, e como temo. Morrer não é somente fechar os olhos e acordar num outro mundo. Isso é morte física. Se não especifiquei acima do que quero falar, somente foi porque acredito que morte é o ato de manter-se distante. De tal forma, na verdade, que por mais que meros metros sejam a causa da separação, há uma barreira infinita, indefinida e invisível - a qual não se pode ultrapassar -.
Quando se visita um cemitério, são apenas dois ou três metros de terra que o separam da pessoa que está a repousar por debaixo. Mas se você cavasse essa terra toda, e ainda não satisfeito, segurasse o cadáver em seus braços, isso adiantaria?
Não. Morte resume-se ao ato de ter de dizer adeus. No sentido próprio da palavra. É ter de despedir-se sem ter deixado claro o fim. É perder parte do coração.
Saudades é algo tão bonito quanto é cruel. Mantemos na cabeça memórias insondáveis de coisas que aconteceram e que deveriam ser esquecidas. Por que não lembrar-se mais daquilo que deve ser lembrado? Por que não esquecer mesmo, aquilo que causa dor?
Aparentou ser mais fundo agora do que esperava...
Acho que falei demais, demais. Eh, acho que falei demais...

sábado, 17 de novembro de 2007

Fragmento de um dicionário das pequenas coisas cotidianas.

Incredulidade. A arte de não acreditar nas coisas apresentadas diante dos olhos pode ser considerada loucura ou dispersão. Na melhor das hipóteses, os dois conceitos unem-se de tal forma que a separação é improvável. Uma pessoa ímpia alcança tanto o mais alto dos prazeres, quanto o mais funesto temor. Normalmente o intervalo entre as duas situações é mínimo. E a sensação de queda, inevitável.
Fatalidade. Por que por mais que os atos possuam donos, os donos dos donos dos atos divertem-se a valer com suas marionetes. Na teoria do fatalismo indiscutível, a culpa nunca cai sobre os próprios ombros. A semelhança do conceito com a palavra “fatal” não é uma leve coincidência, mas sim uma brincadeira macabra de fonemas e sons. Os dicionários são livros temerosos... Ainda assim, seu conjunto é fascinante! Algo é fatal quando é irrevogável, mortal. Uma situação é aberta à fatalidade quando o seu desfecho é funesto.
Cuspe. A secreção tem lá suas vantagens. Normalmente, porém, vem associada a termos pejorativos. Quando não por somente uma das partes, por todas elas. O ato de cuspir significa expelir o indesejável. Inúmeros sinônimos podem ser citados para suas expressões. A idéia geral é de nojo.
Cicatriz. A marca pode ser vista, ou não. O importante em sua explicação é a diferença que jaz entre uma cicatrização completa - onde a cicatriz é omitida - e a incompleta - onde o sinal marca o ferimento anterior, ainda não de um todo recomposto -.
Chuva. Água caída em gotas das nuvens.
Cinza. Cor.
Sorriso. Seguido ou não de risada, consiste no ato de mostrar a arcada dentária com o objetivo de demonstrar aprovação a um ato, ou situação decorrida. Sincero ou não, queima determinado número de calorias. Não é aconselhado em fotos. Não deve ser repreendido. É visto com mais freqüência em crianças. Velhos não sorriem, por conta da falta de dentes.
Dor. Sentido desagradável que serve como sinal de aviso. A dor pode ser psicológica, ou não. No caso da dor física, determinada parte do corpo, que sofre um machucado, dói para avisar ao corpo de seu estado. Assim, faz com que as atenções do sistema sejam voltadas para aquela determinada parte, visando sua melhora. No caso da dor psicológica, a única parte do corpo que realmente sofre é o coração e, embora seja acreditado assim, tal dor não ocorre de maneira metafórica. A situação toda se dá da seguinte forma: pense no coração como uma rosa vermelha murcha, e na dor como uma robusta mão que aperta a rosa. Esse aperto dói. Não é metafórico e, se queres saber, nem tão psicológico assim...
Cotovelo. Peça de ligação.
Ponto. O fim. Sinal gráfico que indica o término de uma oração, ou frase. Pode ser também o ponto de ônibus, mas isso não vem ao caso por aqui.
Fim. O final de uma situação, ou caso. O adeus. A partida. Ato de terminação. Finalizar. Normalmente escrito com letras bonitas no final de contos de fadas, onde a história, de fato, nunca termina.

FIM
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terça-feira, 13 de novembro de 2007

A frialdade ORGâNICA da Terra

Os vasos arrebentam-se. E de maneira interna, de forma apenas a deixar seus vestígios.
De modo que não haja dor...
E, devagar, as manchas vão aparecendo. Primeiramente tímidas e, depois, de forma mais junta e viva. Deixando bem clara a sua presença vermelha.
Começam mais tarde as olheiras e as tremedeiras continuas, o ar de constante medo e aflição.
Quando, por fim, esquece-se do conjunto, a vida começa a ter novamente o seu charme.
As coisas são novas e indecifráveis.
Brancas e vazias. E esta é a melhor fase.
Antes de entrar no estado seguinte, a euforia é constante.
Por fim, cortam-se os vasos. Pois demora por demais esperar que estes arrebentem-se sozinhos.