Como eu amo escutar o som único no silêncio interrompido. Dizer sem palavras aquilo que sempre penso. Ah, minha fiel platéia está lá novamente esta noite, e estará amanhã para ouvir-me soluçar. Em suas mesas - distantes do palco - é fácil ver-me endoidecer e girar na ponta dos pés, na dor que é suportar meu próprio peso. Seus vestidos galantes e brilhosos não irão se arrastar naquele chão imundo de madeira... Por outro lado, suas cadeiras - confortáveis e limpas - farão com que fiquem sentados enquanto apresento meu show.
Na tragédia que é viver, os holofotes encaram somente o personagem principal. E esperam seu desfecho trágico, friamente. É típico esquecerem-se dos coadjuvantes, e é por isso que prefiro monólogos. As câmeras de alguns fotógrafos - pagos antecipadamente - cegam com seus flashes os olhos de quem não enxerga na luz. Tanto melhor não encará-los.
As falas saem cuspidas e a expressão pouco se modifica. Monólogo de um ato só. Os trocados valem à pena por tão pouco, pois falar da loucura é contar verdades para um público cego, tal qual faziam os bobos da corte com seus nobres - e é delicioso -. E às vezes, somente às vezes, em boas noites, tenho de forçar-me para não sorrir em cena, ou acabaria com todo o contexto. Mas é difícil vê-los rir de sua própria desgraça, sem reconhecê-la nunca.
Os aplausos escondem as outras cenas, entrelinhadas no palco e atrás de suas cortinas: nos bastidores, outra atriz é traída por um diretor que não lhe dará o papel principal. Em seu camarim ela chora, borrando toda a maquiagem da peça seguinte. Este mesmo diretor foi ver uma bailarina mais interessante, cansou-se. Em cima do palco, um velho senhor não vê a hora de dormir em sua cama. Espera atento ao sinal para mudar o foco de sua gigantesca luz, enquanto bebe seu café quente e amargo - responsável por mantê-lo acordado -. No palco, a tragédia e a loucura fazem-se presentes para o deleite da ignorante platéia de alto requinte, que ri de cada episódio retratado logo à frente. Pobremente presos aos seus luxuosos vestidos e ternos, como que em gaiolas apertadas - ladras do canto dos colibris -, eles não fazem idéia do que riem. Mas o riso faz-se parecer apropriado e sincero, na hipocrisia de seus dentes brancos. Já por de trás das cochias, envolto na escuridão e responsável tanto por subir as cortinas quanto por soprar as falas esquecidas, sussurra um menino sem talento algum.
O tango do pianista, logo abaixo, avisa que a peça teve o seu fim. De pé, uma senhora de vestido preto aplaude, sem entender, o fim “mágico” daquela obra prima. A cortina desce devagar, enquanto me dirijo cansada para o fim do corredor. Ainda vestida a rigor, e maquiada exageradamente, desço as escadas dos fundos para o que promete ser uma noite fria. Longa noite fria, longe do acolhimento do teatro ou da tortura de interpretar novamente.
São onze e trinta e cinco e vou pra casa, andando pelas ruas sujas. Ando sozinha, e ainda escuto o tango do pianista em minha cabeça, recortado somente pelo som dos saltos dos sapatos batendo no concreto. Não chove, não venta. Nada é diferente da noite anterior. Amanhã o espetáculo será o mesmo, e platéia o aplaudirá novamente. Que mundo esse do Showbiz... Somente desejo um cigarro antes de dormir.
Entre palavras e pensamentos, um achado. Tesouro escondido que nunca será de um todo encontrado.
segunda-feira, 21 de janeiro de 2008
domingo, 13 de janeiro de 2008
Certo Elevador Levou-me Longe e Embora.
Do outro lado da praça, eu te vi passar. Devagar, a passos curtos.
Apenas uma rua. Uma rua apenas nos separava, talvez nem isso. Mas eu te vi passar do outro lado, embora você não tenha me visto. E ficou somente nisso.
Eu não corri pra te abraçar, ou contar uma novidade sem importância. Você não me chamou a correr até a sua casa, pra me mostrar uma coisa banal. Eu somente te vi passando, um tanto diferente do que veria em outras épocas - é verdade - e esperei o tempo suficiente para que não nos encontrássemos.
E ainda distante, eu te vi caminhar por entre tanta gente... Tão diferente de todas elas, de alguma forma. O aperto no coração não foi maior do que o do dia anterior. Durou um tempo menor também.
Se a cena durasse mais do que cinco minutos, isso seria surpreendente. Eu mudei a minha rota, só para não te ver. Antes disso, mudaria quantas vezes fossem necessárias, só para te encontrar. E ainda assim, você caminhava a passos curtos. Os pensamentos distantes, muito longe dos meus.
Por fim, você virou a esquina. E desapareceu no meio da multidão. Tanta gente que te teve tão perto na calçada, e não sabia quem era você.
Voltei minha cabeça para onde a tinha deixado. Peguei um ônibus, fui pra casa. Ainda por muito tempo, olhei a calçada por onde você caminhava, mas você não estava mais lá.
Apenas uma rua. Uma rua apenas nos separava, talvez nem isso. Mas eu te vi passar do outro lado, embora você não tenha me visto. E ficou somente nisso.
Eu não corri pra te abraçar, ou contar uma novidade sem importância. Você não me chamou a correr até a sua casa, pra me mostrar uma coisa banal. Eu somente te vi passando, um tanto diferente do que veria em outras épocas - é verdade - e esperei o tempo suficiente para que não nos encontrássemos.
E ainda distante, eu te vi caminhar por entre tanta gente... Tão diferente de todas elas, de alguma forma. O aperto no coração não foi maior do que o do dia anterior. Durou um tempo menor também.
Se a cena durasse mais do que cinco minutos, isso seria surpreendente. Eu mudei a minha rota, só para não te ver. Antes disso, mudaria quantas vezes fossem necessárias, só para te encontrar. E ainda assim, você caminhava a passos curtos. Os pensamentos distantes, muito longe dos meus.
Por fim, você virou a esquina. E desapareceu no meio da multidão. Tanta gente que te teve tão perto na calçada, e não sabia quem era você.
Voltei minha cabeça para onde a tinha deixado. Peguei um ônibus, fui pra casa. Ainda por muito tempo, olhei a calçada por onde você caminhava, mas você não estava mais lá.
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