domingo, 18 de maio de 2008

Trapézios.

--- Não é com uma surpresa total que venho a escrever isso aqui. Na verdade, é bem uma coisa previsível. Eu não sou a maior admiradora da geometria. Acho tediante. Acho que não gosto por que não a entendo. Não entender me frustra, então me desligo das preocupações sempre que posso. Às vezes a gente não pode, mas isso já são outros quinhentos... Eu sou tediante às vezes também. Ninguém sabe do tédio tão bem quanto eu. As coisas passam rápidas, por que se não fosse assim, seria monótono. Imagine um dia que demora 24 horas pra passar? Mas tédio maior são as coisas que admiro. Digo tédio para quem não as admira, pois não as devem entender. Esse negócio de não entender o outro é complicado. Recordo-me, por exemplo, que sempre achei certos museus um verdadeiro “enfadonhar” de gente que anda arrastando os sapatos. Sim, gosto de arte e tudo. Mas gosto de vê-la e saboreá-la. Pronto. Só que nos museus, sempre tem um sujeito analisando uns traços numa tela. Ora! São traços numa tela! Há aqui telas muito mais interessantes, preste atenção nelas, por favor! Mas o sujeito deve entender os traços. E nessa parte, eu até o entendo. Sim, pois se tivesse nesse museu uma tela com o formato de um trapézio, eu me deteria nela por mais tempo do que necessário. Poderia ser somente uma tela preta, mas se com a forma de um trapézio, me prenderia. Sabe, eu adoro trapézios, as figuras geométricas mesmo. Gosto tanto que dedicarei esse texto somente a eles.
--- Acho que tenho isso porque trapézios me lembram do circo. E eu gosto de circo. Imagino um onde somente figuram os trapézios e a arquibancada vazia... E alguns deles são enormes e estão presos lá no alto. O amarelo é trapezista, o vermelho o apresentador. Algo me diz que o azul é o palhaço, mas existem tantos deles! Alguns são grandes, outros tão pequenos que cabem na palma da mão. E eles não têm platéia, são elitistas, os trapézios! Não andam por aí, por exemplo, com os paralelogramos (os quais - escutei certa vez - são quadrados e chatos). E então eu entro e vejo aquela tenda azul e vermelha imensa... Tudo vazio de gente, mas cheio de trapézio.
--- Lembro-me de meu primeiro contato com eles. Senti-os. Foi assim, identifiquei-me. Desde então, quando ouço a palavra em qualquer lugar, dou um risinho, ainda que escondido. Trapézio, para mim, é uma coisa que pensa e anda. Mas anda no mundo dos trapézios, por isso ninguém nunca vê. Imagino até qual seria a reação deles se me vissem em seu circo. Seria engraçado...
--- Eu resolvi que tinha de escrever algo sobre eles, por que ninguém nunca soube dessa minha paixão pelos trapézios. Em parte, por que a considero uma paixão assim, meio ridícula e nunca contei a ninguém. Em parte porque acho que merece ficar escondida. Veja, você não deve entender os trapézios, mas eu os entendo. Entendo tanto, que não consigo descrever. Eles são todos muito parecidos, sabe? Às vezes até acho que são iguais. Mas não são não... E acho que eles me entendem também. Quando os vejo figurando qualquer coisa, acho que eles me sorriem, e eu retribuo. Aposto que isso explica muitos dos meus sorrisos a esmo. Não foram a esmo. Foram para os trapézios.
--- Da última vez que tentei falar deles (sim, pois eu tentei muitas vezes, embora falte coragem), ninguém me deu ouvidos. Não devem achá-los importantes, eu não sei. Talvez, se pararmos bem parar pensar, não sejam realmente úteis. Mas são bonitos, e coisas bonitas não têm de ser úteis. A beleza é, na verdade, sua única utilidade.
--- Eu gosto de pensá-los no circo, exercitando-se para os espetáculos que apresentarão. É uma pena que não tenham platéia! Deve ser um bom show... Por outro lado, é bom que ninguém visite o circo. Gosto de tê-lo só para mim. Gosto de visitar os MEUS trapézios.
--- Esse discurso não deve ser lá muito esclarecedor, embora devesse ser. Afinal, é uma confissão. Mas qualquer dia eu te levo no circo, se você prometer não contar a ninguém. Sei onde fica de cór. Sei como chegar lá num minuto. Gosto de lá... Meu professor de geometria pouco sabe da minha relação com os trapézios, duvido que ele tenha algo parecido! Na verdade, desconfio que tenha algo com triângulos... Talvez por isso se interessou por ser professor. Mas a geometria definitivamente não me fascina. Só os trapézios... Ah! Gostaria de entendê-los numa amplitude tal, que pudesse ver seu show... Seria magnífico! Movimento de trapézio deve ser uma coisa linda... É, acho que eu queria ser um trapézio.

Um comentário:

Acadius Piscius disse...

A gente tem que ter uma conversa séria sobre esses textos que você anda escrevendo... ¬¬
hahaha
quando você for professora de geometria, os alunos vão fazer piadinhas dizendo que dá pra resolver todos os problemas transformando em trapézio... talvez a Celma pensava isso na sua juventude durante o renascimento, só que com logaritmos. E o Jorge, com triângulos... hehehe
te amo!